terça-feira, 18 de maio de 2010

MÓVEL

       Incomunicável móvel em sala em estar. Imóvel móvel in novel. Ritual de visitação familiar. Laços garantindo aprofundamentos necessários aos vermes que saem do necrotério infame. Quando sobramos para os nossos irmãos, apenas garantimos lembrança terna e doce. Vulto guardado no canto da sala, móvel ignorado em conversações coletivas. Valor, ignóbil força sem direção. Apontamos para o passado para esclarecer o que sobrou de pequenos diálogos inúteis.

O móvel esquecido no canto da sala, irmão assumido, vergonha repudiada pelo ceio familiar, contém versos, prosas e jóias em suas gavetas. Cumpre, sem apegos, o mendigar de afetos entregues ao ambiente rude dos que se governam por funções reprodutoras.

       Incomunicável móvel, no domingo, dia de todas as tristezas, resolvi ver show televisivo na sala. Lá, acompanhando os amigos do meu irmão, apenas recebi um olhar. “Lindo móvel, Art nouveau. Antigo, valioso. Torneado por mãos masculinas, delicadeza de foice. Você vende? Alguns antiquários o tomariam por raridade sem valor. Vende?” Torceu os olhos de vergonha no interesse lançado às gavetas esquecidas. Aumentou o som para celebrar aos visitantes embriagados por pernas que percorrem campos em estádios.

O Móvel Pouco Traduzido: “Artefato, quero pernas pressionando abdomens e pêlos rasgando entradas.” Gritos aos quatro cantos, esquecimento causado por falta de diálogo. Eram ouvidas palavras de louvor à força levantada para fins reprodutores.

Imóvel móvel in novel ainda binário.

Danilo Machado